terça-feira, 5 de outubro de 2010

Palavras e Acepções II

Deve-se sempre ter muitos cuidados com as palavras, e mais ainda com as suas possíveis acepções, porque elas podem dizer muitas e diversificadas coisas. E, como alguém disse certa vez, "devemos pensar sobre todas as coisas, mas nunca dizer tudo o que pensamos." Sabe-se que palavras são significantes que podem ter um, ou diversos significados, sendo estes mutáveis em função do contexto em que são empregados. Os significados podem ser conotativos ou denotativos. Há significados que só se definem com o apoio de outras palavras complementares. O sentido conotativo é aquele que dá à palavra um valor figurado. Já o sentido denontativo é aquele que concede à palavra um valor literal. Então, dependendo do que se queira, pode-se fazer referência literal ao que é figurado, e referência figurada ao que é literal.
Em princípio todo discurso é vazio, precisamente porque o ato de se comunicar é por concessão, a saber, o sujeito-falante se concede expressar, enquanto, o outro, o sujeito-ouvinte, se concede entendê-lo. Em sentido mais amplo, os falantes e os ouvintes vivem uma sugestão de comunicação, quando, na verdade, se comunicam muito pouco. Neste ponto pode-se dizer que há muita palavração, e reduzida comunicação útil. Apalavrados todos os humanos são, porém, comunicadores pouquíssimos conseguem sê-lo. A "raça" humana é, em certo sentido, nivelada pelas palavras, visto que, tanto o doutos, como o indoutos, falam em igualdade de direito concessório. Pode haver, em termos gerais, uma ditadura da palavra, mas também há uma democracia dos falares e subfalres. Resta, então, saber quem fala, o que fala, quando fala, por que fala, onde fala, a quem fala. Porque, quem é o dono da língua, o que há por trás da norma coloquial, ou por trás da norma culta? Quem nestes casos discute formas, conteúdos, ou ideias?
Vê-se, hodiernamente, em pleno quadrante da história informacional, o palco onde atores ensaiam e apresentam seus discursos, plenos, ou vazios, conforme suas conveniências. É recorrente no teatro da política o discurso vazio. É deste contexto que surgem as palavras mágicas referidas no artigo anterior. É o discurso do "politicamente correto": inclusividade, sustentabilidade, políticas afirmativas, renda, empregabilidade, segurança disso, segurança daquilo, ética, democracia, cidadania, dignidade, etc. Quando pronunciadas, todos se põem em prontidão, porque disto dependerá um furo de reportagem, a aceitação em um determinado círculo fechado, um cargo de confiança, uma negociata às escusas, e por aí vai. Há um forte apelo à aceitação no ser humano, e, para tanto, muitos se passam por "politicamente corretos", quando, de fato, não o são. O discurso vazio pode versar sobre qualquer assunto, e pode ser proferido por qualquer pessoa. O aborrecido não é o discurso ser vazio, mas o discursante. Todas as discussões do "politicamente correto", nada mais são que o que é do dever do Estado e do cidadão. O problema reside em quem fala e nas razões da sua fala.
A sensibilidade à esperteza humana se desenvolve muito cedo, permitindo a percepção do como ser aceito, e do como se dar bem sem muito esforço braçal. Muitos enchergam o caminho dourado por onde enveredam, adotando postura e discurso, que, em sua significação, é vazio, posto que estão mesmo interessadas em chegar ao sucesso e à fama. Seria de bom tom que os palavrantes lessem Jacques Lacan em "As Formações do Inconsciente", para descobrir como os significantes formam e amoldam o inconsciente. Correr-se-ia menor risco de ser ludibriado por picaretas que são tidos como grandes virtuoses e gênios da política.

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